segunda-feira, dezembro 27, 2004

Mensagens codificadas



Jorge O.Bento in Abola

1- Os tempos são de louvor e confiança. A justiça funciona, totalmente alheia a motivações ou pressões de ordem política ou afim. O facto de os acontecimentos surgirem em determinadas conjunturas não passa de mera coincidência. Tudo corre conforme à tramitação normal dos processos, independente das inclinações e preferências dos responsáveis. Quem vir o contrário ou é vesgo ou cego ou então mal-intencionado. Espero que o leitor não vá por aí e seja lúcido e inteligente. Comunguemos do espírito da quadra natalícia; sejamos pessoas puras, ingénuas e de boa-fé!

2- Como se sabe, o marquês de Pombal-talvez o mais esclarecido governante da nossa história - não era pessoa para ceder a ameaças e chantagens. Conta-se que, certa feita, o embaixador de Espanha o terá ameaçado com a invasão do nosso país. O firme e sábio Sebastião José de Carvalho e Melo respondeu, sereno e de pronto, que isso não o fazia recuar nas suas posições, porquanto um homem em sua casa vale tanto que, mesmo depois de morto, são precisos quatro para o levar. Foi mais ou menos assim que o dragão respondeu à bazófia de gente do Chelsea. E não será de outra maneira que reagirá a todas as tentativas de o apoucar e subestimar. Aos que sofrem de amnésia é bom lembrar que aquilo que não mata nos torna mais fortes. Foi sempre deste jeito que nos erguemos em todas as quedas e delas arrancámos em direcção ao alto. Como se viu no Japão. Não é uma qualquer contrariedade que nos arrefece o ânimo e tolhe os passos. Nos nossos hábitos não se inscreve o da cobardia, nem o da ingratidão e deslealdade. Foram muitos anos, dias e noites a entoar cânticos, a plantar sorrisos e a colher sonhos, a dizer aos nossos filhos e netos que o Porto ganhou. A ensinar que o azul não é uma cor mas a tonalidade ideal da mistura de todas as cores. Isso não se varreu da nossa memória, nem na nossa consciência grata e obrigada secou o nome do seu obreiro. Da nossa boca e do nosso coração só podem ser esperadas palavras e gestos de solidariedade. No resto seremos mudos. Aos fracos convém recordar que Roma não paga a traidores.

3- Quem tem telhados de vidro não deve atirar pedras para a casa do vizinho.

Já se sabe que não é este o caso da instituição. Nela tudo é e sempre foi limpo, correcto e transparente. Não há perdões, mais ou menos encapotados, de dívidas fiscais. Não há negociatas ou promiscuidades político-partidárias. Não há favores e arranjos autárquicos na construção do estádio. Nunca ganha com erros (que palavra tão cândida!) dos árbitros. Não, não há nada disso ou de parecido. A instituição é um monte de alvura e claridade, donde irradia o fogo de regeneração do sistema, das organizações e das mentalidades. A instituição é um exemplo das mais altas virtudes e das mais nobres e rectas condutas. Nela arde uma fogueira, mais quente e voraz
que a da Inquisição, para queimar a peste das almas perdidas. A instituição é a chama moral da hora que passa. Acabaram a hipocrisia e a falsidade.

4- Há muita, mesmo muita gente envolvida na política (e até em altos cargos) que não sabe a história de Portugal. Não sabe a epopeia lusitana, os seus feitos e autores, nem os lugares por onde ela se derramou. São também muitos os pretensos políticos que não conhecem sequer a geografia do País. São igualmente muitos os que não fizeram nada de palpável em qualquer área profissional e não exibem nada de substancial no plano das ideias. Saltam directamente das fraldas para a política; sobem nela à custa de compadrio e carreirismo, de fretes e colagens, e não por vocação, formação, convicção e competência. É este o baixo perfil de muita gente que enxameia lugares cimeiros e fulcrais da administração. Não me vou meter em juízos acerca dos seus gostos e carácter mas sempre direi que nunca pensei que fosse possível um país como o nosso, tão conservador em termos de ética e moral, cair nas mãos de figuras tão desviadas do estereótipo tradicional. Que proposta ou visão de Portugal poderemos esperar desta gente? Que noção de governo do País ou de responsabilidade pública é que ela tem para oferecer? É duro dizê-lo mas não podemos esperar nada de positivo de personagens marcados pela aridez de princípios e ideias. Esta gente não tem qualquer sentido de missão; é seca de paixões e emoções patrióticas; move-se em função de interesses. Na sua consciência não cabem preocupações e obrigações em relação ao bem comum, nem abertura à alteridade. Sim, muitas figuras de proa esquecem que o bem-estar individual e o geral são conciliáveis, que a felicidade pessoal implica a dos outros. Falam do Natal e dizem-se cristãos mas calam as razões da vinda de Jesus e a mensagem dos evangelhos que Ele deixou. Para eles o outro e o diferente não existem. Os pobres são cada vez mais pobres e ignorados; só contam como eleitores manipuláveis e alienáveis.

Com tal gente não há futuro. Aos que fazem este jornal e aos que o lêem,incluindo as suas famílias, desejo um santo e feliz Natal.