terça-feira, junho 03, 2008

CRÓNICAS DOS MAGALHÃES



Mas os adeptos, Senhor, por que padecem assim?

Manuel do Laço [...] chorou corajosamente. Reparem bem na imagem: é a de um homem a quem acabam de roubar tudo.

1- Todos os dias nos chegam notícias que acentuam o rumor da agonia do Boavista. Hoje supõe-se que os que lhe acrescentaram mais vida (Valentim Loureiro) ou o ergueram à glória (João Loureiro) também lhe trouxeram a morte.

Talvez porque o futebol não era exactamente o jogo deles; mas também não era exactamente disso que queria falar, só dos adeptos, condenados que estão a pagar os erros alheios com a sua dor irreparável.

A decadência de um clube representa o desaparecimento de uma comunidade, que fenece também, entre gemidos mais ou menos sufocados, pois são poucos os que são capazes de expor publicamente a sua dor, como o adepto conhecido por Manuel do Laço, que chorou corajosamente à porta da Liga.

Reparem bem na imagem: é a de um homem a quem acabam de roubar tudo; ou será a de uma criança que foi expulsa de casa, sem abrigo ou afectos? Este é um caso singular, bem sei, de sublimação amorosa. Para estes adeptos excessivos os altos e baixos do seu clube são também uma narrativa da sua própria vida, mas atente-se no estudo do Social Issues Research Center, onde se garante que o futebol é para 35% dos portugueses a "coisa mais importante da vida".

Ora bem, percebe-se a ideia e regista-se o número, mas a premissa merece ser corrigida. O futebol não é um aspecto da vida. É outra vida. Para muitos, a melhor e mais importante das duas. E é essa outra vida que está prestes a ser subtraída (digamos assim) aos adeptos do Boavista. E não será isso, também, um crime? Os ex-dirigentes continuam a dirigir noutros lados, os jogadores estarão a jogar noutros clubes em Agosto, mas os adeptos, Senhor, por que lhes dais tanta dor, porque padecem assim?

2- Já aqui tinha alertado para os perigos ocultos da aceitação da punição do Conselho de Disciplina da Liga pela SAD do F.C.Porto. E o maior de todos eles acaba de chegar com a nota de culpa da UEFA, que pode impedir o clube de participar na Champions, a sua outra vida, e também a mais importante.

Lindo serviço, este que os administradores da SAD, mais a sua elogiada multidão de juristas, prestaram ao clube. Custa a crer que não tenham percebido que havia mais do que apenas seis pontos em jogo, mas foi isso que aconteceu. Marcaram um golo na própria baliza e agora têm de recuperar a desvantagem até ao dia 3 de Junho. Porque, no dia seguinte, há, outra vez, quarta-feira europeia. Quem diria, não é? A pensar que já estávamos postos em sossego e ainda nos faltava passar por esta provação insuportável.

E lá está, também não foi nada connosco , ninguém pediu a nossa opinião, somos apenas adeptos, por que teremos também nós, Senhor, de padecer tanto assim?
Àlvaro Magalhães, in JN, edição papel









Então e a Juventus?

Estou plenamente convencido que a UEFA não terá moral para penalizar o F.C. Porto.

Há boas razões para estarmos todos apreensivos com o que a UEFA vai decidir sobre a participação ou não do F. C. Porto nas competições europeias da próxima temporada.

A entidade que rege o futebol europeu habituou-nos desde sempre a ter dois pesos e duas medidas e privilegiar ou pelo menos a ter mais cautelas quando os interesses económicos estão em jogo.

É sabido que o peso das grandes equipas faz-se sempre sentir quando em causa está uma presença nas finais europeias. Várias equipas portuguesas, incluindo o F.C. Porto, já foram prejudicadas em momentos decisivos porque a capacidade económica dos adversários e as receitas, sobretudo televisivas, que dai adviriam eram sempre tidas em conta.

Também é conhecida a disparidade que muitas vezes a UEFA usou ao exigir estádios com condições para receber jogos europeus, obrigando os clubes a terem todas as condições e depois deixar que equipas sobretudo as do Leste, com infraestruturas do século passado e sem condições mínimas de trabalho para os jornalistas nunca sejam repreendidos por isso. Não se percebe pois as dúvidas que agora subsistem a propósito deste caso que envolve o F.C.Porto.

A questão é simples: então o que vão fazer à Juventus, cujo ilícito de corrupção comprovada em 2006 atirou com o clube para a segunda divisão. Na altura não foram qualificados para as competições europeias mas este ano estão com presença garantida.

E que se saiba ainda ninguém pôs em causa a presença da equipa italiana. Ora, se há retroactivos da lei de 2007 para o F.C. Porto para um alegado ilícito em 2004, esses mesmos critérios servem para a Juventus?

A que propósito a UEFA faz agora questão de enviar notas de culpa e a que propósito se fazem manchetes levantando dúvidas que não são mais do que desejos escondidos de alguns milhões que no campo desportivo não conseguem os seus objectivos. Reconhecendo que foi um erro crasso não recorrer dos seis pontos, estou plenamente convencido que a UEFA não terá moral para penalizar o F. C. Porto. Mas estas "iluminuras" europeias já nos habituaram a dois pesos e duas medidas. Por isso, é caso para estarmos apreensivos. Seria um escândalo.
Júlio Magalhães, in JN, edição papel